sexta-feira, setembro 23

OSESP





...Luz,luz, mais luz! Sempre fiquei a pensar, o que Goethe, quis realmente dizer com estas palavras antes de morrer... Ele estava em êxtase, enxergando a Luz, que juntamente com a morte vinha para teus olhos, ou na verdade era o desespero meio as trevas que o fazia implorar pela Luz? Uma coisa ou outra? ... Eu não contava, com o fato de poder ser as duas...
Há uma semana atrás, mais precisamente na sexta-feira, realizei um sonho...Mas foi tudo tão diferente do que por várias e várias vezes imaginei...
Fomos em cento e vinte pessoas (entre professores e alunos), a cidade de São Paulo, assistir a apresentação da OSESP... Carmem, professora de arte, amiga de uma comunhão de alma inefável, presenteou-me mais uma vez, com a suspensão da vida para eu poder enxergar a arte... Aceitei de pronto o convite, para acompanhar as crianças do colégio, onde damos aula, a mais esta aventura... Para minha alegria, fiquei incubida de cuidar do ónibus 2, isto é 5A, mais cinco alunos que eu pude convidar... Amo esta turminha, eles são meus bebes, desde a primeira série estão comigo... Lembro do primeiro dia de aula, aqueles olhares assustados, na quadra, a tempestade levando tudo, raios e trovões, e todos eles tão pequenininhos juntos com os pezinhos molhados, e a tia Márcia, gritando ensandecida: Fiquem calmos! Fiquem calmos!!! Já vai passar!!!! E só piorava....rs... aí sem lá quem, das crianças, teve a brilhante ideia de gritar: Nós vamos morrer!!!!!!!!rrsrsrss... Ai meu Deus!!!! Um monte de criança chorando... Do nada surgiu um guarda chuva, e eu peguei um a um,cada um deles no colo (aproximadamente quarenta) e subi as escadas com todo o cuidado pois a enxurrada era muito forte e eu não conseguia ver os degraus... Quando todos estavam na sala, me coração se comoveu intimamente com aquelas crianças que a tia Marcia enxugava os pezinhos, emprovisadamente com folhas de jornal e a longa fila de sapatinhos um do lado do outro a frente a secar... Enfim, conhecer a Sala São Paulo, ouvir a OSESP, era a realização de um sonho, mas com meus bebes, tudo era muito maior...
A euforia das crianças no ónibus, o cheiro das plantações de laranja, pela estrada, foram dando lugar, a insensante pergunta: Já estamos chegando? ...E a cor verde foi dando lugar ao cinza, e um rio morto sufocava minhas crianças que fechavam as janelas e cobriam seus narizes com a blusa do colégio... Sampa de Caetano ecoava em mim... Minha incompreensão por São Paulo, só torna meu amor mais pulsante... Nasci neste concreto, e a putrefação que me recebe, não me impede, de ser arrebatada por uma beleza tão voraz, que me consome, que me faz dizer que é belo o que para outros e o próprio horror...
Como a Sala São Paulo, promoveu este programa para o ensino fundamental das escolas estaduais, imagine a quantidade de crianças, de ônibus de filas... Nesta história, nosso ônibus acabou ficando congestionado, duas ruas à frente do local, isto é , ficamos ilhados bem em frente a cracolandia... Luz, Luz, mais luz... Há uma miséria maior do que morrer de fome no deserto; é não ter o que comer na terra de Canaã (José Américo de Almeida -A bagaceira)... Nem eu, nem minhas crianças, tínhamos visto nada igual... Ouvi uma voz dentro do ónibus, que repetia, fechem as janelas, puxem as cortinas...".. Nenhuma criança obedeceu, nem eu tive coragem de fazer coro... Eu também queria ver... como uma ferida aberta, fratura exposta, já não adiantava fechar os olhos, a dor já dissolvia a alma... Dilacerante era o turbilhão de pensamentos e sentimentos... O cheiro fétido de urina sufocava mais, que o rio morto... Eu vi homens que andavam de um lado para outro, mas não tenho muita certeza se estavam vivos... João, um aluno, pra variar, sempre fazendo perguntas difícieis: As pessoas sabem que eles estão aí? Por que ninguém faz nada? Bom, não deu pra responder, até mesmo porque na hora não conseguiria,(e pra ser bem sincera, nem agora) mas é que eu tinha que pedir pras crianças pararem de tirar fotos, aquilo não era um ponto turístico, e aquelas pessoas não estavam em uma exposição...
O ónibus aos poucos começou a andar, mas eu ainda precisava de ar, precisava de Luz... Meu Deus, quantas crianças, revirando o lixo, sob o olhar passível de dois abutres... e outros tantos que revoavam sob o céu, azul, límpido, claro... Mas em minha alma tudo era noite, escuridão... Silenciosamente, através da janela de vidro, tentava relembrar o poema de Drummond, que causou-me tamanho transtorno (odiava análise sintática- aliás pra que serve mesmo?), mas que agora pouco importava o sujeito e o predicado do verbo...Lembrei alguns trechos, e eles faziam sentido, para a noite que chegou em minha alma...

A NOITE DISSOLVE OS HOMENS- Carlos Drummond de Andrade

A noite
desceu. Que noite!
Já não enxergo meus irmãos.
E nem tão pouco os rumores que outrora me perturbavam.
A noite desceu. Nas casas, nas ruas onde se combate,
nos campos desfalecidos, a noite espalhou o medo e a total incompreensão.
A noite caiu. Tremenda, sem esperança...
Os suspiros acusam a presença negra que paralisa os guerreiros.
E o amor não abre caminho na noite.
A noite é mortal, completa, sem reticências,
a noite dissolve os homens, diz que é inútil sofrer,
a noite dissolve as pátrias, apagou os almirantes cintilantes!
nas suas fardas.
A noite anoiteceu tudo... O mundo não tem remédio...
Os suicidas tinham razão.
Aurora, entretanto eu te diviso,
ainda tímida, inexperiente das luzes que vais ascender
e dos bens que repartirás com todos os homens.
Sob o úmido véu de raivas, queixas e humilhações,
adivinho-te que sobes,
vapor róseo, expulsando a treva noturna.
O triste mundo fascista se decompõe ao contato de teus dedos,
teus dedos frios, que ainda se não modelaram mas que avançam na escuridão
como um sinal verde e peremptório.
Minha fadiga encontrará em ti o seu termo,
minha carne estremece na certeza de tua vinda.
O suor é um óleo suave, as mãos dos sobreviventes
se enlaçam, os corpos hirtos adquirem uma fluidez,
uma inocência, um perdão simples e macio...
Havemos de amanhecer.
O mundo se tinge com as tintas da antemanhã
e o sangue que escorre é doce, de tão necessário
para colorir tuas pálidas faces, aurora.

Luz, Luz... Mais Luz! Por favor...
Frente a sala São Paulo, toda organização do evento, mobilizada, rádios transmissores, ternos e camisas brancas, filas (mais filas!!!!), ufffa...
Tocar o saguão iluminada pela abóboda do Imperio do Café... Meu Deus! O quanto da história da minha pátria não foi escrita ali, sob os chãos que agora eu, simples Bia, agora pisava, corria, brincava... quando as portas abriram pra mim, da Sala, meus olhos estupefatos, invadiram-se de Luz... A imensidão do belo, o meu corpo imerso na beleza, os camarotes inatingíveis, as estrelas no céu de madeira... Depois de uma breve apresentação histórica, os músicos, as palmas, desordenadas de mil e quinhentas crianças elevam-se enquanto as luzes abaixam-se ...
Não minto se digo que pela primeira vez escutei Bach... Pois antes, tudo passou a não valer mais! Só consegui olhar pra trás, falar sem palavras, obrigada, a Carmem!
Apesar de nunca ter parado pra pensar, qual o caminho da música no meu corpo, parecia bastante óbvio que ela entrava pelo ouvido e ia pra cabeça.. Pois se é assim que é, não foi isso o que aconteceu... meu corpo inteiro reverberava ao som, um tremor no espírito, uma alegria que transbordava por não caber em si, e um sentimento de religiosidade... Difícil não ajoelhar, pois se tem vontade de conversar com Deus,pois de repente ele parece estar tão próximo!
Senti tanta gratidão... Gratidão, para com Deus, com a minha amiga Carmem, com minhas crianças, comigo, por não ter sucumbido a dor, e ter seguido em frente...E um nome... O mesmo... O de sempre.... "Giovana, Giovana, Giovana!!!!Minha pequena amiga pala sempe, você deveria estar aqui, junto a mim..."
Não clamava mais por Luz, ela invadira minha alma, arrebatando me ao som de Villa Lobos... Meus olhos apenas reconhecia a Luz...
Uma coisa ou outra? Não sei, sinceramente não sei... nas marquises, o invisível, a miséria humana, o abandono, o desespero em pequenas pedras separados apenas por um vidro, da opulência, da grandiosidade, da arte, do belo, da superação da imanência da natureza humana... Eu clamei por Luz, pois vi as trevas, e vi Luz, que iluminou a noite que em mim se formou... Eu vi dois mundos que não se misturam, eu vi a divisão do dia e da noite, e fiquei a pensar como uma poderia encontrar a outra...
Voltando pra casa, com as luzes do ônibus apagada, só pensava em chegar logo em casa e contar pra Giovana que conheci um homem que se chama Bach e que disse a mim: "Jesus, alegria dos Homens"...



Sala São Paulo, antiga estação de trem,


Mil e quinhentos...


Esta é a turminha do fundo!!! ri muito com eles...Agitar a galera é com eles mesmo!!!!


Camilinha, meu anjinho!!!Desde a primeira série ela é minha aluna, sequer consigo chama-la de Camila... "Camilinha", pois é o meu bebê!!!


Praça da Luz... passeando pelo antigo quintal da nobreza,


Professora Aldiny, gosto tanto de conversar com ela,


Uma parada, para conhecer o comércio informal. Ágata ao centro (de azul), minha alegria este ano foi tê-la de volta no colégio, depois de quatro anos que ela partiu sem eu conseguir me despedir ...


Pessoal do grêmio (que me ajuda muuuuuuuuito)!!!!Arthur e Andressa, vocês são show!!!!!!!


Dário, desde a quarta série juntos, fiz questão que ele fosse, pois ele é a cara de São Paulo... Um espírito metropolitano, cheio de intelectualidade e contemporaneidade 


Cento e vinte...


Toda lateral...


O guri, que esta fazendo chifrinho é o João...


A cara da minha, amada mãe São Paulo,


Gilliard, desde a primeira série juntos, sapeca e incrivelmente brilhante... As tiradas dele, são ótimas!!!Domina tudo!!!Eta entre os melhores goleiros mirins...


Reorganização da turma...Sob o comando de Lúcia e Cris


Rosa e azul...


as menininhas que me obrigaram felizmente a entrar na Pinacotéca e descobrir, que eu poderia entrar com todos...Foi uma festa!!


O hip hop indo ao encontro de Strauss,


Lucia, muuuuuito chic


Sentei bem na frente, do lado esquerdo, onde ficou todo o colégio, smplesmente dava pra ouvir a respiração dos violinistas...


Meu anjinho, novamente!!! Já no fim da aventura e cheia de histórias pra contar...



Moisés, amo os relatos dele, seja da viagem que ele fez, ou de como caiu da bicicleta, sempre é cheio de detalhes e exageros... Camilinha.


Marcos e Aláx, prata e bronze (volei e basquete)


Meus ferinhas...


Princesinhas,


Carmem, te amo, minha irmã!


Janelas do Café


Janelas da Pinacoteca


Janelas internas da Pinacotéca


Janelas da Estação da Luz;


estrelas em céu de madeira;



Janelas da Estação da Luz


...As trevas, para enxergar a Luz.


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