sábado, dezembro 15

TODO COMEÇAR


"Basta começar para ver como é difícil concluir. Todo começo resiste. O primeiro passo que se dá é um revelador inexorável. Adificuldade que se toca fere como espinho. [...] Além disso, tinha à roda de si, a perder de vista, o imenso sonho do trabalho perdido. Nada mais perturbador do que ver manobrar a difusão das forças no insondável e no ilimitado. Procuram-se os fins. O espaço sempre em movimento, a água infatigável, as nuvens que parecem afadigadas, o vasto esforço obscuro, toda essa convulsão é um problema. Que faz este perpétuo tremor? Que constroem estes ventos? Que levantaram estes abalos? Em que se ocupam os choques, os soluços, os gritos? Que faz todo esse tumulto? O fluxo e refluxo dessas questões é eterno como a maré.Gilliatt sabia o que fazia; mas a agitação da extensão era um enigma que o aturdia confusamente. Sem querer, mecanicamente, imperiosamente, por pressão e penetração, sem outro resultado mais que uma fascinação inconsciente e quase feroz, Gilliatt pensativo ajuntava, ao seu trabalho, o prodigiosos trabalho inútil do mar. Na verdade, como não impressionar-se e sondar, ali à vista, o mistério da tremenda vaga laboriosa? Como não meditar, na proporção da meditação que se tem, a oscilação da onda, a impetuosidade da espuma, a usura imperceptível do rochedo, o esfalfamento insensato dos quatro ventos? Que terror para o pensamento não é o recomeçar perpétuo, o oceano poço, as nuvens Danaides, todo esse trabalho para coisa nenhuma! Para coisa nenhuma, não; só o Ignoto o sabe!

(Trabalhadores do Mar - Victor Hugo).

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